sábado, 25 de dezembro de 2010

BERILO, BW, BERILO - Ney Leandro de Castro



BERILO, BW, BERILO

            Berilo Wanderley era um. excêntrico light, ameno, cordial. Ele podia  decretar alguns dias de silêncio e solidão para si mesmo, mas logo depois estava numa mesa de bar conversando sobre cinema, discutindo textos  dos seus autores preferidos e rindo um riso maravilhodo quando o interlocutor o atingia com uma tirada de humor.
Dividir uma mesa de bar com Berilo era uma dádiva. E essa dádiva sempre foi mais concedida a Maria Emilia, sua namorada, seu xodó, seu grande amor. No Granada, geralmente as quintas-feiras, numa mesa iluminada pelo abajur lilás da paixão, diante de uma garrafa de vinho e duas taças, lá estavam Berilo e Maria Emilia. Conversavam baixinho, olhos nos oIhos, como duas pessoas que estivessem trocando as primeiras palavras, os primeiros encantamentos. O amor era lindo. De vez em quando, um intruso pedia licença e se sentava com o casal, que nao o repelia  par delicatesse, como diria um poeta admirado por Berilo. Na maioria das vezes, eu ficava numa mesa distante, pensava na minha infelicidade e tinha medo.
          Uma das lembranças mais bonitas que guardo de Berilo data de 1961: foi a sua volta de Madri, onde ele fez pós-graduaçao em Direito. Os amigos organizaram um desfile de carros que passou pelo Grande Ponto, levantou multidões (o povaréu devia pensar que era Yuri Gagarin ou do mesmo nível) e seguiu para a Presidente Quaresma, endereço de Rômulo Wanderley, pai do homenageado e meu querido professor no Atheneu. Foi festa muita. Bebida no meio da canela, comida para um Regimento de Infantaria.
           Desfile igual aquele, só quando Marta Rocha se exibiu de maiô (ai, meus pecados!) pelo Grande Ponto, pouco depois de perder o concurso de Miss Universo por duas polegadas a mais nos quadris.
          Berilo, o excêntrico cordial, procurava esconder sua timidez, mas na maioria das vezes não tinha êxito. Aquela festança foi aceita e suportada por ele movido a álcool. No dia-a-dia, sua timidez quase sempre prevalecia. Como promotor de justiça, se desentedeu consigo mesmo: era muito tímido para enfrentar o teatro do juri popular e poeta demais para pedir a condenação de alguém. Eu o vi, só uma vez, atuar como promotor de justiça, quando por pouco não pediu a absolvição do réu.
          Era assim mesmo. Para Berilo o que valia era a mulher amada, os filhos, os amigos, as mesas de bar, o cinema, a literatura. Dinheiro era bom porque pagava os vinhos de Nemésio Morquecho, mas ganhá-lo com uma profissão daquelas era um horror. O jornalismo que ele exerceu com brilho seria uma boa opção, se o salário desse, pelo menos, para fazer umas compras no Alecrim.
          Em horas de tristeza e desapontamento, me enternece a lembranças de ter convivido com pessoas como Berilo Wanderley, Newton Navarro, Luís Carlos Guimarães. Talentos múltiplos, almas generosas, inteligências fora do comum. Vejo os gestos largos e ouço a risada de Berilo, escuto os ensinamentos de Newton, bebo a última taça de vinho com Lula. Não, os meus mortos não estão dormindo profundamente. Eles caminham comigo, fazem uma doce algazarra, quebram os silêncios da minha alma.
(Ney Leandro de Castro)

2 comentários:

  1. Excelente. Fiquei sabendo tudo sobre a vida de Berilo. Parabéns

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  2. Essa eu não conhecia. Tente colocar a data, se tiver acesso. Valeu demais!

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